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"A alma que não se abate, que recebe indiferentemente tanto a tristeza como a alegria, vive na vida imortal."Fonte - Bhagavad-Gita

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

A Tristeza de Arjuna


Swami Dayananda Saraswati


Pergunta: Swamiji, o senhor analisaria, por favor, a diferença entre a tristeza de Arjuna e a tristeza de uma pessoa normal?
Swamiji - A tristeza de Arjuna nasceu de um conflito entre os seus sentimentos e a chamada do dever. Por um lado, ele achava que tinha de lutar contra pessoas que conhecia e respeitava, pessoas que eram ligadas a ele, ou por laços de sangue ou porque fossem amigos ou conhecidos.
A luta surgiu como o resultado de dois fatores: vingança e dever.

O sentimento de vingança sentido por Arjuna, ao chegar ao campo de batalha, desvaneceu-se quando ele considerou a enormidade da destruição envolvida. Arjuna sabia que haveria muita destruição no seu próprio campo, e, como esperava vencer, a expectativa de destruição para o outro lado era total. Para vencer, teria que destruir todo o exército de seu oponente. A estimativa de Arjuna do resultado era puramente pragmática. E com esse ponto de vista esperava começar a batalha.
Arjuna sabia muito bem que Duryodhana não se renderia. Definitivamente, esse não era o seu tipo, mesmo se tal ação fosse concebível, o que naqueles dias não o era. Ele lutaria até ao fim, até ao último homem. Arjuna sabia que uma total destruição do outro lado significaria a destruição de seu próprio mestre, Drona, assim como a de Bhisma, nobre ancião da família, altamente respeitado. Este era o problema de Arjuna.

O problema era mais complexo para Arjuna porque havia uma questão de dever envolvida. Duryodhana tinha usurpado o reino que aos Pandavas competia governar. O irmão mais velho de Arjuna, Dharmaputra, era o rei, ainda que estivesse no exílio. Era seu dever proteger o Dharma, juntamente com seus irmãos, os príncipes coroados. Duryodhana tinha desconsiderado o Dharma por todos os meios possíveis. De qualquer modo que olhemos as ações de Duryodhana, mesmo aquelas de sua infância, elas sempre foram questionáveis. Certamente, num passado recente, ele se portara de modo bastante impróprio.
Face a essa situação, que escolha tinha Arjuna? Nenhuma. Tinha que lutar. O dever o chamava, e dever nada tem a ver com nossos sentimentos. Por conseguinte, pelo fato de que os sentimentos de Arjuna entraram em conflito com o seu dever, havia tristeza. Se nos colocarmos em uma situação onde temos que nos destruir mutuamente, haverá, sem dúvida nenhuma, tristeza. Este é o sentimento de uma pessoa normal, que é suficientemente amadurecida para avaliar o que representa o seu dever, mas que, ao mesmo tempo, tem as naturais emoções humanas.

A tristeza de Arjuna, como tristeza, não perdurou. Tornou-se alguma coisa deveras diferente. Primeiramente, ele sucumbiu e, em seguida, indo além da guerra, dos reinos, do Dharma e Adharma, ele quis saber o sentido de tudo isso. Arjuna era uma pessoa especial, que vivia uma vida de integridade moral. Não precisava por-se à prova para ninguém. Sua tristeza era a tristeza de uma pessoa amadurecida que se sentia sem qualquer controle sobre as situações de sua vida. Arjuna queria evitar a luta em razão da destruição envolvida, mas não podia - uma situação, na verdade, muito sombria.

Sua tristeza levou-o à apreciação de certo problema humano fundamental. Por essa razão, ele solicitou o conhecimento que resolveria este problema. A tristeza de Arjuna não se assemelhava, por exemplo, à dor de depressão. A depressão nasce da raiva, da raiva da infância. Não existe tal coisa como uma depressão originária do presente. Qualquer um que esteja deprimido, definitivamente, encontra-se assim em razão de uma raiva relacionada à infância. Qualquer coisa acontecida, ontem, na vida de um adulto, realmente não causa depressão. A depressão surge devido a uma formação de raiva progressiva, oriunda da infância. Por conseguinte, a raiva é a causa da depressão, e a raiva em si mesma é originada por algum tipo de profunda dor. Quando essa dor, na forma de mágoas, culpas, e várias outras coisas, desenvolve-se, vem a depressão.

Depressão não era o problema de Arjuna. O problema de Arjuna é aquele no qual as realidades têm de ser devidamente entendidas. O problema tem de ser tratado de duas formas: primeiro, ao nível de onde ocorre, e também tem de ser conduzido de um modo cognitivo.

O problema de Arjuna é sobretudo um problema ético, moral e espiritual. Naturalmente, todos os problemas têm algum conteúdo emocional. E por isso são problemas. Problemas - outros que não sejam o de Arjuna - são todos problemas emocionais. Aqui, embora o problema seja também emocional, a moralidade é predominante, não a emoção. De fato, a diferença entre as duas espécies de problemas depende do que predomina - a emoção ou a moralidade, estando ambos os fatores ligados ao ser.

Na depressão, o ser está também envolvido, desde que a depressão implica numa certa avaliação de si mesmo que não é verdadeira. Por conseguinte, pode-se resolver o problema fundamentalmente, se pudermos com ele lidar e compreendê-lo. O problema que aqui estamos discutindo - o problema de Arjuna - pode e deve ser solucionado de modo fundamental.
Arjuna tinha que reavaliar, por completo, seu pensamento. Cognitivamente, ele tinha de mudar tanto a visão de si-mesmo e do mundo, como as suas noções acerca da morte e da destruição. Tudo tinha que ser reexaminado.



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